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Irresponsabilidade
A escola nunca os entusiasmou muito. Ano após ano, sempre o mesmo sacrifício. Levantam, carregam a sacola, chegam à escola, aturam os professores, os colegas, as aulas. Saem da escola, regressam a casa. Amanhã e depois, outra e mais outra vez. A escola não é local de felicidade. É um desatino.
Completam dezasseis anos, o mundo do trabalho espera por eles. Quando não antes! Abandonam a escola. Sem qualificação e habilitação académica suficiente, que fazer? Começam por carregar baldes de massa, tijolos, vigas. Carregam, chegam, lavam, arrumam ferramentas. Sobem e descem. Empoleiram-se nos andaimes. Depressa percebem que é preciso saber mais. Curiosos e interessados vão aprendendo com os mais velhos. Agora já pegam na colher, assentam tijolos, usam o nível vertical e horizontal. Amanhã já trabalham o ferro, pintam ou fazem trabalhos mais especializados. O fim do mês começa a ter piada. Juntam dinheiro. Compram o primeiro carro.
Como vizinhos da porta não fazem milagres, há que pensar em ir mais longe. Um amigo mais velho trabalha fora. O convite não se faz esperar. Rapidamente é aceite. A notícia agrada aos progenitores. A promessa de ganhar mais dinheiro é boa. Terá que sair à segunda e regressar à sexta à noite. A mãe prepara-lhe com todo o carinho a sacola, bem diferente da sacola da escola. Para além da roupa, carrega-lhe algumas coisas boas que há lá por casa para que possa comer quando a refeição não for do gosto do rapaz. Passam meses, anos talvez, e surge novo convite. Agora é a promessa de mais dinheiro ao fim do mês. Só que é preciso ir mais longe. Despede-se do actual patrão.
No café da aldeia avisa os amigos que logo à noite não poderá encontrar-se com eles para falarem dos jogos deste domingo. Vai de viagem. E a viagem dura toda a noite. Todos dormem. Só o motorista se mantém acordado, dirigindo aquela carrinha a alta velocidade. É preciso chegar antes das sete. É muito longe e ainda por cima, do outro lado, a hora é adiantada em sessenta minutos. Felizmente, tudo corre bem. Uma, duas, três, muitas vezes.
A semana decorre a uma velocidade incrível, mas ao mesmo tempo, a sexta-feira parece nunca mais chegar. São doze horas de trabalho por dia. É necessário, por um lado, cumprir objectivos da empresa, por outro, ganhar mais e mais dinheiro. O sacrifício tem que valer a pena.
Sexta-feira regressam. Depois de uma semana tão dura, é preciso encontrar formas de distracção, de entretenimento. Juntam-se todos no largo da aldeia. Combinam programas mais ou menos radicais. Desta vez vão experimentar os bólides. Fazer habilidades. A adrenalina toma conta deles. Sacam peões, cavalinhos… Rotações ao rubro!
Chega a Guarda. Manda parar. A loucura é grande. Não obedecem à autoridade. A perseguição é inevitável. Coima aplicada. Carta apreendida. E agora?
Tanto trabalho à semana!
Tanta irresponsabilidade ao sábado à noite!
A. C. "
Sem dúvida Marco, mas o sr. A.C, que por acaso, eu sei quem é, tem uma visão redutora da vivência e do desenvolvimento cabeceirense, agora, e porque se começou a falar no desemprego nesta terra e que afecta principalmente os jovens, que vendo-se privados da convivência da familia e amigos, devido à obrigação de rumar a Espanha em busca de melhores condições de vida; são tratados como irresponsáveis. é urgente mudar de governação em cabeceiras, mas mais urgente é mudar a mentalidade e a forma de pensar de quem se submete ao jugo do poder e concorda com tudo que se diz e se faz, mesmo que sejam coisa ditas pelo senhor A.C. a responsabilidade de encarar os problemas com realismo e responsabilidade tem de ser uma obrigação de todos quantos possam ajudar a pensar nesta terra e nesta região de uma forma livre e independente. não duvides! enquanto puder farei tudo para estar ao lado de quem pensa e actua de uma forma livre e responsável...Abraço
ResponderEliminarEu acho que não nos devemos render à inevitabilidade desta realidade. Também acho que este A.C procura senão directa, pelo menos indirectamente, frisar a irresponsabilidade dos nossos jovens, quando se refere que nunca se motivaram com a escola. e que depois, por causa disso, o seu destino inevitável foi chegar massa e fazer cimento. Será caso para perguntar porque é que esta é a nossa realidade actual. E o que fizeram ao longo destes anos os senhores que detêm o poder nesta terra, para inverter este fadário. Eu sei que me vão dizer que falar e apontar o dedo é fácil e nada resolve. Eu sei. Mas é verdade que se gastaram ao longo dos últimos 14 a 17 anos, milhares de contos em cursos de formação profissional que deveriam servir para qualificar estes jovens que hoje rumam a espanha, cursos esses que se tivessem uma vertente mais técnica, carpintaria, electricidade, pichelaria, pastelaria e panificação, serralharia e outras, teriam com certeza aberto novas perspectivas a estes mesmos jovens. Mas a realidade tem demonstrado que a formação profissional nesta terra ( e têm sido investidos centenas ded milhares de contos)tem servido unicamente, não para qualificar ou profissionalizar, mas sobretudo para criar formandos profissionais e subsidiados políticos, que transitam de curso para curso, e que ao fim de vários anos, sabem tudo acerca de coisa nenhuma. Para esta visão pessimista e redutora de A.C só há um caminho e uma resposta: Formação profissional de qualidade e com objectivos bem definidos.
ResponderEliminarMeus Senhores, não denigram a imagem de quem vai buscar o dinheiro a Espanha para viver melhor, quem ler diz que eles são analfabetos e muitos até têm muitas qualificações, por ex.: carpintaria; electricidade; pichelaria; serralharia e outras, são todas qualificações precisas para ser um bom “trolha”.
ResponderEliminarHoje em dia vêm-se tolhas com tanta qualificação ou mais, que decerto muitas pessoas que têm um bom emprego, e quanto a esses que transitam de curso em curso, somente para ganhar dinheiro, tem toda a razão.
Mas não estamos em nenhuma ditadura.
Senhor Zeca ninguém aqui denegriu a imagem de ninguém, muito menos de quem tem que partir para espanha em busca do "el dorado" que a sua terra não lhes consegue oferecer. Apenas e só se referiu que isso acontece, porque muitos deles não têm qualificação especializada. Se um indivíduo tiver conhecimentos técnicos de pichelaria ou electricidade por exemplo, até pode em Cabeceiras montar a sua própria empresa e ser ele próprio gerente. Se não se quiser chatear muito com papelada e burocracia, até consegue viver só dos chamados biscates. Eu sei e digo-lhe que é verdade, que conheço jovens com formação de electricista nesta terra, que só de biscates chega a tirar cerca de 900 euros por mês. Agora é um jovem a quem foi ensinada essa arte e que depois tirou cursos de especialização, fora do concelho. É por isso que eu acredito na formação profissional e na qualificação de qualidade, como forma de inverter e combater o fenómeno da desertificação. Por norma, quem não possui qualquer tipode qualificação, naturalmente tem que efectuar trabalhos mais pesados, como operários de construção civil, que não deixam de ser tão respeitáveis como qualquer outro. Quanto à existência de ditaduras respeito a sua opinião embora não concorde com ela.
ResponderEliminarEste é um flagelo que teremos de combater.
ResponderEliminarA profissionalização é algo que o Ensino tem descurado. Falta mão-de-obra qualificada nestas áreas. A criação de escolas profissionais ou/com cursos profissionais bem estruturados e coincidentes as realidades concelhias é um passo necessário e inevitável.
Quanto a ida destes jovens para o estrangeiro: é a consequência visível de uma conjuntura socio-económica e educativa de propoções nacionais e concelhias.
A dignidade do trabalho é algo que habituamos a descurar, devido a muitos factores, mas é tempo de mudarmos de mentalidade e valorizar mais quem trabalha e menos quem diz ou intenta trabalhar.
Eu apenas tenho a certesa que a maioria que vai para a Espanha trabalhar, vai para ganhar mais dinheiro, eu conheço algumas pessoas que estavam a trabalhar noutro ramo que sairam para ir ganhar simplesmente mais dinheiro.
ResponderEliminarEntão, para Espanha, marchar...marchar! Rapidamente e em força.
ResponderEliminaristo é que faz o país ficar mais rico, ou pensa que há trabalho para todos nesta terra?nem queira obrigar os que lá estão a vir ganhar uma miséria para aqui.
ResponderEliminarTenho dito...
Pois. Essa é boa. Tu só não vais para Espanha, porque com toda a certeza és um subsidiado político municipal, ó anónimo das 20.21 horas. Falar é fácil, os outros como eu, que têm que se levantar às 6 da manhã que verguem a espinha, ó patarata!!!! E o dinheiro que me sobra é pouco ou nenhum, ao fim do mês e pouco tempo tenho para o gastar.
ResponderEliminarNão sou nenhum subsidiado político municipal nem patarata.
ResponderEliminarTrabalho por conta doutrem e ganho pouco mais que o ordenado minimo,se tivesse de ir para Espanha ganhar mais tambem ia.
Vai para te sobrar mais dinheiro ao fim do mês
às horas que escreves-te devias estar a deitar-te,andaste toda a noite a gastar mais algum e depois não tens.