01 maio 2010

De leitura aconselhável

Não tarda, o FMI estará de novo a passear por aí.

A explicação fácil é a de que o país teria hoje condições mais difíceis do que ontem para responder pelas suas obrigações.

E porquê? Porque nas últimas 24 horas produzimos menos? Não consta. Ou porque foi ao contrário? Também não sabemos. As oscilações nas taxas de juro da dívida pública não têm relação com a conjuntura económica no mesmo espaço de tempo. Têm a ver, isso sim, com os humores do tão badalado "mercado".

E o que é este "mercado"? O cidadão de Alcabideche não compra dívida pública. Quem compra obrigações dos Estados são instituições públicas e privadas de natureza financeira que, quando muito, as propõem aos seus clientes. Mais de dois terços da dívida grega está nas mãos da banca alemã. A banca nacional, por exemplo, tem 6,8 mil milhões de euros colocados em Atenas. Como decidem os bancos? Avaliando o risco. Se é elevado (taxa de juro alta), a expectativa de retorno compensa o perigo de incumprimento pelo Estado. Se é baixo (caso alemão, por exemplo) o investimento rende fraco ganho, mas é dinheiro em caixa.

Pergunta seguinte: e quem mede esse risco, quem informa o "mercado"? Aqui entram as agências de rating. Elas começaram por ser empresas que vendiam informações a potenciais compradores e vendedores de títulos de dívida. Com o tempo veio a centralização – há 4 no mundo, três norte-americanas e uma inglesa – e a sua irmã gémea, a corrupção. O termo não é meu, mas de Paul Krugman, nobel da economia. Com efeito, as firmas pagam a estas agências as notas que elas lhes dão. Este "mercado" funciona na base do princípio do emitente-pagador. Como ninguém corta a mão a quem lhe dá de comer...

As duas maiores agências encontram-se actualmente sob investigação do senado norte-americano. A "ameaça constante da perda de negócios" levou-as a "massajar" os indicadores em que se baseiam as notas. Como escreveu o nobel acima referido, elas "distribuem bilhetes de identidade falsos". Sabemos que assim é: 93 por cento dos títulos subprime classificados em 2006 como AAA são hoje lixo tóxico. Em matéria de credibilidade estamos conversados - elas subestimam o risco de quem lhes paga tanto como sobrestimam o das dívidas públicas.

Porque não se põe fim a um oligopólio que nos trama mas que foi incapaz de prever a bancarrota do Dubai e da Islândia? Porque não se criam, em substituição, agências públicas transnacionais, independentes dos interesses em jogo? A resposta é estúpida, mas não há outra: basicamente por nenhuma razão.

Mais estúpida do que ela só a constatação final: a Standard & Poor's atribuiu A– a Portugal porque este se revela incapaz de crescer... enquanto receita um PEC ainda mais recessivo. O aluno não será grande espingarda, mas o avaliador, esse é impagável.

Texto escrito por Miguel Portas.

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