06 maio 2009

L.

«As 25 maiores instituições que geriam produtos de crédito de alto risco (“subprime”) dos Estados Unidos, cuja actividade degenerou na maior recessão global desde a Segunda Guerra Mundial, gastaram quase 370 milhões de dólares (278 milhões de euros) na última década em operações de "lobbie" e donativos para campanhas de políticos.

O objectivo era evitar a adopção de regras mais restritivas para o sector, conclui uma investigação citada pelo “Financial Times” e que será hoje tornada pública.» in[Público]

Esta investigação apenas alicerça, ainda mais, a convicção do que o «poder económico», através de lobbying ou do financiamento de campanhas políticas, condicionam as políticas governativas e a legislação (através dos governantes e legisladores) à sua medida. Nada de novo, sabe-se que o «lobbying» é quase tão antigo como o acto de governar ou legislar. Contudo, a sua antiguidade não mascara o quão deturpador do conceito de governação e legislação pública é esta ingerência. Pois, o «lobbying» não é mais do que um processo de condicionamento de políticas e leis que visa a satisfação dos mais singelos e individuais interesses, nomeadamente de foro económico, sobre os demais. Esta prática é regulamentada e legalizada (quem terá pago?) em vários países e instituições. Os EUA são a "capital" do lobbying, seguidos da instituição União Europeia (que possui cerca de 4265 lobbistas creditados e a exercer função).

Transpondo esta "realidade" para o nosso país, é fácil constatar que as políticas de governação em Portugal também se pautam por esta batuta. Não sou eu que afirmo. Há exemplos quanto baste por este país. Recordo-me, antes da implementação da crise, de visualizar alguns «arautos» da política portuguesa, em sessões televisivas de debate político, que volta e meia insinuavam a legalização do lobbying. O argumento utilizado era a necessidade de legalizar esta "realidade". Diziam, eles, que o lobbying já está implementado na governação e nos meandros de decisão política portugueses, embora na surdina. Então, para combater esta hipocrisia era de "bom tom" legalizar esta forma de condicionar a governação (quase tão antiga quanto o acto de governar).

O exemplo da notícia dada em epígrafe é paradigmática das consequências negativas que este tipo de condicionamento pode abarcar para a maioria. Pois, as consequências positivas serão, quase inevitavelmente, evidentes para a minoria que patrocina o lobbying. Em Portugal também há lobbistas, embora, não creditados. Um exemplo ilustrativo é a "transferência" de políticos e governantes para a administração de grandes instituições económicas. À partida, a "transferência" não se efectuou na base nos créditos que tinham como gestores públicos mas, sim, pelas suas "carteiras de contactos políticos".

Ao contrário daqueles que querem legalizar este tipo de comportamento, defendo que, antes de mais, se deve combater este comportamento desviante. Não ignorá-lo, como se faz. Esta "realidade" existe então o que a ética democrática impõe é o combate a este tipo de ingerência governativa. Não o contrário. Regulamentar e legalizar este tipo de comportamento é legalizar o que de pior tem a promiscuidade entre o serviço público e o interesse privado.

16 comentários:

  1. Li com interesse o artigo de Marco Gomes relativo à questão da legalização, ou não, das práticas de "lobbying", matéria que me suscita os seguintes comentários:
    Não tenho nesta, como em outras matérias, uma ideia "feita", por isso venho a debate. Quero ouvir argumentos e contra-argumentos para, se vier ao caso, me decidir. As achegas que trago são, entretanto, as seguintes:
    1. Parece ser certo que o "lobbying" é mais um produto da democracia norte-americana que pode não ter aplicação nas democracias europeias e poderá até ser-lhes prejudicial. Na verdade, de acordo com o artigo "linkado" pelo Marco, com origem na "Wikipédia", poderá dizer-se que existe "lobbying" organizado nas instituições europeias desde os anos 70 do século passado, porém, também está escrito que os únicos países europeus com legislação publicada, sobre a matéria, são a Geórgia (1998), a Lituânia (2001), a Polónia (2005) e a Hungria (2006) e que "não existe regulação nos restantes países europeus". Se ficarmos por aqui, pouco mais há a dizer. Penso que as diferenças dos modelos de governação, que reflectem o entendimento do papel do Estado e das respectivas políticas sectoriais - educação, saúde, ambiente... - são semelhantes áreas em que as diferenças são evidentes, sem que o debate entre as vantagens e inconvenientes dos dois modelos, europeu e norte-americano, possa realmente alguma vez ser encerrado, tal é a complexidade das variáveis em evolução. Porém...
    2. Sou relativamente sensível ao argumento de que haverá vantagens em assumir o que é uma evidência: que há interesses e que os grupos, políticos e económicos, tendem a agir de acordo com esses interesses. Se estes não forem "declarados" - a famosa e prévia "declaração de interesses" - os debates tendem a ser mais subtis e geram discursos do tipo, já escutado em Portugal, "eu-sei-que-o-senhor-sabe-que-eu-sei-que-o-senhor-sabe..."
    3. Também julgo saber que a imprensa escrita, nos Estados Unidos, adopta o mesmo sistema de "declaração de interesses" quando se trata de acompanhar, por exemplo, campanhas eleitorais. Este princípio facilita a leitura dos interessados e assegura, porventura, maior transparência no debate. Suponho que esta postura tem vindo a ganhar adeptos na Europa, havendo jornais, espanhóis que no contexto de campanhas eleitorais "tomaram partido". Não será esta uma postura honesta? O que é isso de imprensa "independente"? Alguém conhece?...
    4. Quase por fim, um argumento que até pode ser a excepção que confirma a regra, se a regra for um não ao "lobbying": Quanto devemos ao trabalho de "lobbying" de Ramos Horta para o sucesso da independência de Timor Leste?
    Creio que o argumento do Marco é mais ou menos este: O "lobying" comprou o silêncio dos reguladores do mercado. Mas não aconteceu o mesmo, por interpostas pessoas e entidades, nas economias europeias? As diferenças entre o que se passou na Europa e nos Estados Unidos não terão consistido, sobretudo, numa questão de dimensão, que nada deve ao facto de haver, ou não, "lobbying" legal? Poderá dizer-se que nos países onde o "lobbying" não está legalizado os mercados foram menos sujeitos a manipulações políticas no âmbito da regulação?
    Espero com estas questões estimular o Marco e outros eventuais interessados pois, como escrevi no início, não tenho uma opinião definitiva sobre assunto. Percebo que, na defesa do interesse público, o Estado tenha que estar acima dos interesses, o que dificilmente poderá acontecer se houver partidos políticos financiados pelos grandes grupos económicos. Mas não poderá garantir o "lobbying" a intervenção crítica e fiscalizadora de organizações de cidadãos e de Organizações Não Governamentais? Gostaria portanto de conhecer a opinião de quem se interessa pelo assunto e que possa trazer novos dados ao debate. Agradeço ao Marco Gomes o ter suscitado a questão.

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  2. Caro José Nobre,

    A tendência de regulamentar o "lobbying" na Europa, salvo a excepção da instituição europeia, vem como consequência destes últimos anos em que, findado o muro de Berlim e tudo o que este simbolizava, os países de Leste viram, e os EUA também, uma oportunidade em desenvolverem economicamente tendo por base e exemplo os EUA.

    Daí, que estes países estejam a regulamentar o "lobbying" e a instalar políticas mais "americanizadas".

    Quanto à assumpção da realidade. Pois, é um pressuposto difícil. Assumir-se que é "pressionado" para definir leis que, à partida, deveriam ser universais e embebidas no bondoso intuito do bem comum, só é possível com a regulamentação do "lobbying". Mas não nos esqueçamos do que estamos a tratar, regulamentar a "pressão" sobre os legisladores e executivos é, no meu ver, um verdadeiro arrepio ao dever e sentido público. A causa é simples: por mais voltas que demos ao acto de "lobbying" ele continua a ser a elementar pressão por parte de alguns, para proveito próprio, em detrimento dos demais.

    Claro que a "pressão" é algo discutível. Haverá sempre "pressão" sobre os legisladores e executivos. Legítima ou não. E é isto que se deve combater: as "pressões" não legítimas, aquelas que não são exercidas pelos "canais normais" da democracia mas por outros, sejam na surdina ou na legalidade.

    Quanto à imprensa, certamente que não há imprensa independente. Contudo, nos Estados Unidos, não sei se por regulamentação ou por filosofia própria, há assumpção da posição quando existe actos eleitorais. E isto deveria ser posto em prática também em Portugal. Contudo, penso que regulamentar este assunto é descabido. Mas para isto funcionar cá em Portugal é necessário uma mudança, principalmente, cultural. Pois, a realidade e o assumo desta é sempre difícil em se aceitar na cultura portuguesa.

    Quanto ao "lobbying" de Ramos Horta. O "lobbying" exercido por ele foi legítimo por ter sido pelos canais devidos, pela força dos argumentos e pela realidade do povo e da nação timorense. E isto sintetiza a "boa pressão" e a "má pressão". Se reparar não verá grupos ambientalistas a reclamar a regulamentação do "lobbying" em Portugal. A razão pode ser simples e clara. Estes grupos não têm o poder económico e político suficiente para, numa hipotética regulamentação do "lobbying", exercerem pressão legal sobre os legisladores.

    A grosso modo, a regulamentação do "lobbying" só favorece quem tem um poder económico suficiente para influenciar as campanhas e os políticos. O que é, de um ponto de vista democrático, um atentado.

    O silêncio dos reguladores nos EUA foi comprado de uma forma legal. E continua a sê-lo. Vejam os principais contribuidores para a campanha de Obama e verão, directa ou indirectamente, os maiores favorecidos pelas suas políticas. A máxima «não há almoços grátis», também singra no outro lado do Atlântico.

    Na Europa não digo, embora também haja, que a negligência sobre a regulação foi devido somente pela "pressão" exercida pelo mercado. Neste caso, a actuação da União Europeia foi a reboque da actuação dos EUA. Ou seja, o paradigma americano servia de inspiração para muitos políticos e dirigentes europeus que estavam a pouco e pouco a tentar implementar as mesmas regras (ou a falta delas). Juntando a isto e ao lobbying existente na órbita do parlamento europeu e verificaremos que, embora de uma forma mais leve, a tendência dos legisladores em regular o mercado na Europa era no sentido americano.

    «Poderá dizer-se que nos países onde o "lobbying" não está legalizado os mercados foram menos sujeitos a manipulações políticas no âmbito da regulação?»Provavelmente, no sentido em que os meios para que se imponha a manipulação são mais difíceis e obscuros. O que por um lado significa uma dificuldade acrescida para exercer qualquer tipo de pressão. Contudo, convém afirmar que esta análise é muito simplista e superficial. Há muitas variantes em jogo, contudo, um dos factores aqui discutido poderá ter sido determinante para a actual crise: o "lobbying". Ou na minha "tradução livre", a "má pressão" regulamentada. É evidente que a crise foi um cúmulo de más e negligentes políticas e ânsias desmedidas pelo lucro. Políticas, estas, legal e ilegalmente, patrocinadas pelos maiores interessados na fraca regulamentação. Daqui se pode retirar o que o "lobbying" poderá fazer.

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  3. Ok Marco. Creio ter compreendido que o "lobbying" não necessitará de ser regulamentado, dado que as ONG, por exemplo, também exercem contra-poder sem necessitar disso; do mesmo modo, no que diz respeito à "declaração de interesses".
    Pelo contrário, a regulação do "lobbying" pode fazer com que apenas os grandes grupos económicos tenham capacidade para o utilizar.
    Assim, resta-me dizer-lhe que me convenceu, pelo menos por enquanto...
    Abc.

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  4. Acho que temos um exemplo muito concreto do uso do "lobbying" em Basto - Um investimento de 18.125.800 euros, numa via com extensão de 4 Km, Via Rápida entre o nó da Auto-Estrada e Cabeceiras de Basto.

    Acho que o lobby (as tais idas a Lisboa!), é e será uma estratégia para que os nossos autarcas consigam os investimentos do estado central.

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