02 agosto 2008

Antes morrer livres que em paz sujeitos (ao Cavaco Silva)

As ilhas e as gentes açorianas, historicamente, têm sido predominantemente "filo-portuguesa" não obstante, procurassem e reivindicassem o estatuto administrativo de autonomia, mais para se precaver do centralismo do que satisfazer ímpetos independentistas. Este arquipélago, precocemente colonizado por milhares de não-portugueses (flamengos, alemães, bretões, outros europeus, norte-africanos e judeus ibéricos) e portugueses, manteve-se, ao longo da sua história, como um território integralmente lusitano. Os nomes (dos colonizadores estrangeiros) foram aportuguesando-se (e a Onomástica maltratada), muito pela imposição de outros colonizadores portugueses (também pela dificuldade dos escrivães em escrever correctamente o nome original) que receavam uma perda de soberania e de uma passagem, através dos apelidos estrangeiros, de uma herança que pudesse ameaçar a coesão e a nacionalidade portuguesa ali estabelecida.

Esta Região foi um importante bastião de resistência à predominância castelhana, na época filipina (1580-1640), conseguindo ser durante dois anos (até 1582) o único território sobre governação portuguesa e fora dos tentáculos da hegemonia castelhana em Portugal e seus pertences. Daí a máxima que é ostentada no Brasão de Armas açoriano (acima retratado), Antes morrer livres que em paz sujeitos; a proeminência(no brasão) de dois touros que numa história de resistência, aquando de uma tentativa de invasão por parte dos castelhanos, foram importantes a repelir tal intromissão castelhana. Estas ilhas e suas gentes, também, tiveram um papel pioneiro e essencial na introdução do liberalismo em Portugal. Foram, nestas ilhas, que se reuniu as tropas e os pensantes liberais para as "Guerras liberais", sobre a égide de D.Pedro IV e o restante séquito de liberais. O republicanismo açoriano é forte e antigo (nem que seja pelo simples facto dos dois primeiros presidentes da República serem açorianos), tendo-se descoberto, há relativamente pouco tempo, uma tentativa falhada local de assassinato do rei D.Carlos I, meses antes, do regicídio no Terreiro do Paço. Pós Vinte Cinco de Abril de 74, houve alguns movimentos independentistas, que alimentados pelo fulgor político que então se vivia, insurgiram-se. Foram efémeros e pouco relevantes, mais uma vez a Região Autónoma dos Açores cumpria, escrupulosamente, a sua ligação histórica e irrepreensível à soberania nacional.

Esta breve e pouco rigorosa sinopse histórica dos Açores, terra de irreverentes gentes em todo o domínio humano, serve apenas para alicerçar aquilo que os açorianos sempre sentiram e que actualmente é-lhes relembrado "mediaticamente" pelas hostes do poder central: o abandono e o menosprezo das entidades do poder central por esta Região.

O incipiente e vexatório comunicado à Nação do Presidente da República, Cavaco Silva, só serviu e serve para alimentar o desconforto em relação aos políticos e governantes que lhes e nos dominam administrativamente.

O assunto, sobre a inconstitucionalidade de algumas normas do novo Estatuto Político-Administrativo dos Açores, foi aproveitado politicamente, pelo PR, de uma forma triste e repugnante. Vejamos, o mesmo presidente que não se fez "impor" perante os constantes e, verdadeiramente, impropérios à Nação e aos cidadãos deste País proferidos pelo "capitão donatário" Alberto João Jardim, é capaz de, através de uma mera intenção de revisão constitucional ao Estatuto Político-Administrativo (que deve ser revisto perante as deliberações do Tribunal Constitucional e, assim, dar uma chapada de luva branca ao PR), denegrir a imagem dos Açores e dos açorianos, provocando para isso um mediatismo exagerado, que serviu os propósitos políticos do PR em por em "sentido" os socialistas açorianos.

Tendo esta Região Autónoma, um comportamento político e regional exemplar e com as contas públicas contidas e controladas ao contrário da congénere Região da Madeira, a diferença de abordagem e tratamento é gritante. Os Açores não são apenas uma visão de importância geoestratégica, somente para trocas internacionais, nem plataformas para repugnantes actos políticos.

Espero, que a mensagem presidencial, além de ser acatada pelas entidades responsáveis, tenha um reverso negativo para o "homem presidente", que com a sua forma de estar peculiar, tem errado, e conseguído disfarçar, exemplarmente, anos e anos de governação e desgovernação do nosso País.

7 comentários:

  1. Excelente. Boa análise ao fogo de vista de Cavaco.

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  2. Apoiadissimo!
    Gostei particularmente da passagem:
    "nem plataformas para repugnantes actos políticos. "

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  3. "mediatismo exagerado"

    Pôs o país em frente ao televisor (como nos tempos da outra senhora) para falar de coisas que a maioria dos portugueses não entenderam.

    Parabens excelente texto e um bom enquadramento histórico.

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  4. Apoiado. Gostava de ver o Cavaco Silva a fazer a mesma figura se da Madeira se tratasse...

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  5. Análise muito certeira e bem redigida. O Sr. PR nunca conseguiu esconder o seu centralismo mesmo quando foi Primeiro-Ministro. Ex. Foi este Sr. que em tempos se insurgiu contra a introdução portagens na auto-estrada algarvia (Via do Infante), mas que nunca se pronunciou sobre a introdução de outras portagens em regiões menos favorecidas do país e igualmente sem estradas alternativas. É que o algarve é pobrezinho como o caneco!Infelizmente o que se tem passado com os Açores é semelhante ao que se tem passado com as regiões do interior do País - esquecimento. É como se houvesse o País dos ricos e o dos pobres.

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  6. Análise muito certeira e bem redigida. O Sr. PR nunca conseguiu esconder o seu centralismo mesmo quando foi Primeiro-Ministro. Ex. Foi este Sr. que em tempos se insurgiu contra a introdução portagens na auto-estrada algarvia (Via do Infante), mas que nunca se pronunciou sobre a introdução de outras portagens em regiões menos favorecidas do país e igualmente sem estradas alternativas. É que o algarve é pobrezinho como o caneco!Infelizmente o que se tem passado com os Açores é semelhante ao que se tem passado com as regiões do interior do País - esquecimento. É como se houvesse o País dos ricos e o dos pobres.

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  7. Bem redigida?
    Basta ler " o único território sobre governação portuguesa" ( 2º. parágrafo, linha 3)

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